Meu intuito.


"Porque a frase, o conceito, o enredo, o verso

(E, sem dúvida, sobretudo o verso)
É o que pode lançar mundos no mundo."
Caetano Veloso



segunda-feira, 11 de março de 2013

Quem disse?


Eu estava em ponto morto, em banho maria, à toa na vida vendo a banda passar, já tinha me despedido da dor.
E quem foi que disse que eu queria suspirar novamente? E quem foi que disse que você poderia ocupar meu pensamento diariamente? Que hora mais inapropriada para aparecer!
“... e porque existe essa coisa dentro da gente, muito grande e muito consciente, mas que a gente não controla, que nunca esquece a delícia que é começar. Então eu projetei nele todos os meus novos começos: ele era um cara descobrindo um monte de coisas que eu achava que já sabia e que me lembrava outras que eu já tinha esquecido. Eu me via nele, eu via ele em mim. O nome disso é identificação. Porque na verdade a gente quer preencher nossos vazios não com o que nos falta ou completa por ser diferente, mas com o que é confortavelmente familiar”
Se eu pudesse prever, não teria deixado você me conduzir naquele samba meio samba-rock, onde você é tão melhor do que eu. Eu fiquei em desvantagem, desprotegida com os meus passos incertos e deixei você me levar. Dançar foi meu delito.
Se eu pudesse prever, não teria te contado por onde andaria, não teria saído na calçada da Roosvelt, você então passaria reto, não haveria surpresa, nem samba. Não haveria beijo.
“... se eu te encontrasse completamente por acaso hoje, onde seria?”
E não haveria, dias depois, risadas e olhares. Está aí, definitivamente, meu ponto fraco: as risadas e os olhares.
E agora estou aqui, com o coração apertado e essa angústia. Chamo de angústia por não saber do que chamar essa coisa que ora me tira um sorriso bobo, ora me esmaga o estômago.
Nossas bagagens de vida, isso de não mais se surpreender tanto, nem de chorar tanto, nem de sonhar tanto, nem de planejar tanto, nem de sofrer tanto, depois de tantos acontecimentos anteriores. É a dor e a delícia da maturidade, das coisas tão parecidas já vividas, já vistas, já sentidas. A verdade é que a gente caleja para as coisas ruins e para as boas também.
“... hoje eu me pergunto qual o prazo de validade das lembranças. Em que momento elas deixam de ser palpáveis, boas, verdadeiras?”
Eu sei, tão pouco tempo pra eu já estar aqui, com os meus devaneios, colocando um pouco dessa tão curta história no papel que chega a parecer clichê.
“... e quando tudo isso que a gente vê sobre a paixão nos filmes é simplesmente...verdade?
Só os clichês são verdade, no final das contas.”

Quantas vezes eu te escrevi , confessando, “saudade”? Quantas vezes você retribuiu?
“... eu ouço tanta música e penso se você ouve música e se é no computador ou no rádio ou em CDs, quais são eles, se você canta junto, se estaríamos escutando os mesmos cantores no mesmo momento porque o nome disso é “sincronicidade”, se as músicas traduzem seus sentimentos tanto quanto os meus, quais, então, te explicariam a mim, o que eu preciso ouvir, o que eu preciso saber, o que você esconde e o que tem medo de revelar...”
Talvez você não tenha nada para revelar, você me parece não esconder nada. Talvez seja essa a causa da angústia, você não ter sentimento algum para esconder de mim.
Você me faz bem. Você me faz rir. Você me fez retomar a espiritualidade, a leveza e a leitura.
Só que agora está começando a me assustar (olha eu aqui me abrindo de novo, depois das chuvas que apanhei, peguei agora essa mania de transparência, até demais...perdi a mão).
E quem foi que disse que eu queria suspirar novamente? E quem foi que disse que você poderia ocupar meu pensamento diariamente? Que hora mais inapropriada para aparecer!
Sabe aquela história de deixar de rir por medo de chorar? Estou pensando, seriamente, em seguir essa linha...
“é uma escolha, percebe? No final das contas, metade dos encontros que você faz é regida pelo acaso, mas metade é obra do seu próprio esforço e vontade. E como 50% de chance não são nem uma coisa nem outra, a verdade é que a gente sempre sabe. E sempre controla. Mas sempre sofre como se não soubesse. Porque, na hora de sofrer, a gente esquece tudo mesmo.”

Célia Aguiar
(Trechos extraídos do texto da peça “Música para cortar os pulsos”)